Regina Celi Machado

A Terra é hoje o maior de todos os pobres a ser libertado, diz o teólogo Leonardo Boff. A terra está cativa, explorada e doente. Com ela caminham juntos todos os seres vivos e entre eles os humanos.

O primeiro passo no projeto da igreja do Senhor Bom Jesus de Americana foi libertar a terra elevando a construção 4.50m do solo e permitindo libertar também a paisagem e ventilar os arredores.

O acesso à igreja se dá por uma larga escada frontal e uma rampa na lateral com 8,3% de inclinação para o acesso aos portadores de necessidades especiais. Todos os acessos são cobertos.

A escadaria de entrada está coberta por uma laje que se estende por toda a extensão da igreja, passa pelo campanário e termina na cruz que marca este centro de fé.

Térreo – praça

No pavimento térreo estão localizados os banheiros, inclusive para portadores de deficiência física, e um apoio de cozinha para festas. Este es- paço será utilizado como uma grande praça aberta diariamente para uso de toda a comunidade. Sob a igreja o jardim levará à meditação, com caminhos, rampas, bancos, fonte, veio e espelho d’água. Há ainda um palco para apresentações e espaço livre para festas, quermesses, encontros.

O estacionamento ocupa o recuo obrigatório da construção e comporta 35 vagas para automóveis sem comprometer o espaço coberto do térreo.

Um oratório com a imagem da Virgem de Guadalupe ocupa espaço de ligação direta com a rua de maior movimento, é Maria quem primeiro introduz o fiel ao lugar de oração e celebração. O local escolhido possibilita aos fiéis um espaço digno para sua devoção, um contato mais rápido e direto com a imagem da Mãe de Deus, e com liberdade para colocação de flores e para acender velas.

Na rampa está localizada a Via Sacra como um verdadeiro caminho a ser percorrido e rezado ter- minando com o Cristo glorioso dentro da igreja.


Pavimento intermediário
– serviço e devoção

Antes da chegada ao local de culto há um piso intermediário onde estão localizadas a secretaria, a sala do dízimo, a sala do padre, a sala da reconciliação e a sala de paramentação, que possibilita com mais conforto a entrada processional e a acolhida por parte do presidente da celebração e dos ministros.

É neste espaço que estão também os quadros de avisos e cartazes para que não poluam e atrapalhem as celebrações litúrgicas e para que os fiéis possam ter tempo e espaço digno para estar diante deles.

Também na área intermediária, junto à sala de reconciliação, está a capela do padroeiro, espaço devocional fora do espaço de celebração.

Um átrio em rampa dá acesso ao lugar de celebração a partir do pavimento intermediário. O hall é o umbral entre as duas realidades, a do mundo e suas necessidades práticas, e a do salão de culto e a entrega ao Mistério de Deus. Este espaço possui apenas uma pia de água benta e iluminação muito discreta no piso.

Primeiro pavimento – o lugar da celebração

Um painel com uma grande porta impede a visão do espaço interno que deve ser vislumbrado lentamente e cuja visão do conjunto deve causar surpresa ao fiel. Este é o lugar onde as sandálias devem ser tiradas, o lugar santo. A porta central se abre para a procissão de entrada e para a entrada das noivas. A entrada comum se dá pelas laterais do painel.

Logo na entrada estão as duas capelas, do Santíssimo de um lado, e do Batismo de outro. Ambas se comunicam com o espaço de celebração apesar de estarem fora da nave.

A cobertura que protege a escada desde o térreo é a mesma que continua cobrindo todo o grande corredor central em direção ao altar, em direção àquele que é o centro de nossa vida e de nossa fé: Jesus Cristo.

Corredor e cobertura levam o fiel ao altar e ao Cristo transfigurado, representado num grande painel de 12 metros de altura, em mosaico, com roupas brancas na presença de Moisés e Elias.

A cobertura da nave onde estão os bancos dos fiéis é mais baixa que a cobertura central. A cobertura lateral é feita com telhas termo acústicas sobre estrutura metálica. A luz entra pelos vitrais geométricos no triângulo formado pelas coberturas laterais e central. A nave tem espaço para 600 pessoas sentadas e outras 300 de pé.As paredes laterais possuem aberturas na base das paredes para a entrada do ar que fará sua saída cruzada pelas aberturas nos vitrais.

O altar ocupa o centro para onde todas as atenções se voltam. Altar, ambão e cadeira da presidência, polos litúrgicos, formam uma unidade de forma e material e serão em granito branco. O piso também de granito branco possui uma estreita faixa em pastilha vermelha que começa na base da escadaria e favorece a ideia de caminho para o centro. As paredes e o teto também são brancos deixando-se dominar pela cor que chega intensa pelos vitrais.

Para que os fiéis possam ter participação ativa, como orienta o Concílio Vaticano II, a assembleia foi projetada ao redor da palavra e da eucaristia   e não apenas de costas uns para os outros. E a cadeira da presidência salienta a posição daquele que lidera e serve ao mesmo tempo.

Uma área de apoio para a celebração eucarística está localizada atrás do painel com pia e armários para os vasos sagrados. Nas laterais estão localiza- das a sala de som e uma saída de emergência.

O volume externo está marcado pelas linhas horizontais e pelo volume suspenso com pilares recuados. A grande torre com a cruz marca o lugar santo para toda a cidade. Uma torre menor sustenta os sinos. Os volumes horizontais são brancos. As torres, vigas e pilares são em concreto aparente. As grandes aberturas possuem vitrais coloridos.

Conclusão

O projeto atendeu as orientações dos documentos da Igreja pós Concílio Vaticano II sobre arquitetura sacra buscando o dinamismo do culto: o espaço deve servir à execução do Mistério Pascal e à ativa participação dos fiéis; o espaço deve ser funcional; a assembleia deve ser orgânica e hierárquica e constituir uma unidade íntima e coerente.

Como marca bem a Constituição Conciliar, a liturgia é o método mais eficaz para ensinar o que é o cristianismo. E o espaço, o lugar privilegiado para este ensinamento.

No próximo artigo será o pároco que contará sobre a experiência de planejar e construir uma igreja, e nos próximos números abordaremos o projeto iconográfico e a responsabilidade social e ecológica presentes nessa obra.

Regina Céli Machado, arquiteta

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Regina Céli Machado é arquiteta sacra e escreve na Revista de Liturgia.

Fonte do Artigo:
MACHADO, Regina. O passo a passo na construção de uma igreja II, Preparando a páscoa. São Paulo, 224, p. 24 a 25, Mar/Abr 2011.

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